sábado, 4 de maio de 2013

#85 MARTEL, Yann, A Vida de Pi

Classificação: 5*****

Sinopse: Quando Pi tem dezasseis anos, a família decide emigrar para a América do Norte num navio cargueiro juntamente com os habitantes do zoo. Porém, o navio afunda-se logo nos primeiros dias de viagem. Pi vê-se na imensidão do Pacífico a bordo de um salva-vidas acompanhado de uma hiena, um orangotango, uma zebra ferida e um tigre de Bengala. Em breve restarão apenas Pi e o tigre.

Opinião: Este livro – e o respectivo filme – estão envoltos em muito falatório. Primeiro os elogios à tecnologia utilizada para recriar, no filme, um tigre e o ambiente inóspito do pacífico. Ang Lee ganha, felizmente, o Óscar pela direcção deste filme sublime. Uma obra gritante de beleza, espiritualidade e talento. Não imagino um ocidental a consegui-lo. Mas quanto ao filme já falei aqui. Entretanto também o livro havia sido premiado com o Booker Prize. Yann Martel é acusado de plágio – Max e os Felinos, de Moacyr Scliar seria a fonte original. É ainda criticado pela arrogância com que reagiu a essa acusação. Eu lavei-me desse escândalo e isolei-o do conteúdo da obra.
Li, em resenhas de quem já tinha percorrido as suas páginas, que a obra sofre um corte abrupto. Aproximadamente as cem primeiras páginas falam de uma vida na Índia. Um nome, “Piscine”, uma cidade, “Pondicherry”, um jardim zoológico com um rinoceronte que, por se sentir solitário, partilha o espaço com um rebanho de cabras. A Índia… os cheiros, os rostos, as crenças. E um rapaz simultaneamente hindu, cristão e muçulmano. Uma aventura – poderia dizer-se -, visto que este rapaz lingrinhas e vegetariano sofre um naufrágio e fica à deriva no Pacífico com um tigre, uma zebra, uma hiena e um orangotango. Mas não é bem isso, é ainda mais do que isso. Uma aventura interior, contra a nossa própria natureza, os nossos limites, o nosso corpo que cede mesmo quando a mente se esforça por continuar, as nossas fraquezas e melindres. Um conto solitário, angustiante, ainda assim enternecedor. Eu quase sentia a doçura intrínseca entre Pi e o tigre. Tanto o Martel como o Ang Lee conseguiram tornar essa relação sólida, palpável, subtil e credível. É um feito. Sorri com diversas nuances da interacção entre este rapazinho indiano e o tigre.
De facto há uma mudança abrupta da primeira parte do livro para a segunda. Não necessariamente má, como fui levada a crer. A primeira parte é sobre necessidades de ser enquanto a segunda é sobre as de sobreviver. Um livro que nos obriga a rever quem somos e até onde iríamos se a fome, a sede, o medo da morte, o definhar lento, nos instigassem.

Sem comentários:

Enviar um comentário