domingo, 16 de fevereiro de 2020

#243 COETZEE, J. M., Desgraça

Sinopse: Desgraça é muito mais do que um relato social: é um relato de sobrevivência pessoal numa sociedade decadente. Passado na África do Sul pós-apartheid, este romance sincero e despudorado centra-se em David Lurie, professor universitário na Cidade do Cabo, de meia-idade, divorciado, que divide o seu tempo entre o desânimo das aulas e as satisfações momentâneas que encontra numa prostituta. Quando esta o deixa de atender, David desvia as atenções para uma jovem aluna, começando uma aventura sexual que, quando tornada pública, o leva ao despedimento e à humilhação.

Opinião: 
"Está bem, eu vou. Mas só se não tiver de me tornar numa pessoa melhor. Não estou preparado para me regenerar. Quero continuar a ser eu mesmo."

Galardoado com o prémio Nobel da Literatura em 2003, J.M. Coetzee é um Sul-africano naturalizado australiano. Este é o primeiro romance que li da sua autoria, e já acrescentei à lista, para ler, À Espera dos Bárbaros.

Interessa-me muito ler sobre África e as suas complexidades, e durante a leitura veio-me à ideia a trilogia das irmãs Keating sobre o Quénia. Mas o Quénia das irmãs Keating é um Quénia pós-domínio britânico, e a África do Sul de Coetzee é dos anos 90. Dói bastante o facto de ser tão contemporânea, mesmo porque há um senso doloroso de potencial desperdiçado.

A nossa personagem principal, o Professor David Lurie, é produto dessa complexidade cultural. Começa o romance com uma posição relativamente privilegiada, numa Universidade, e é destituído do cargo devido aos impulsos incontroláveis da sua sexualidade decadente. Como homem de meia-idade, horroriza-o a falência da masculinidade, do intelecto, do vigor dos membros para realizar tarefas manuais. Junto da filha, uma mulher corajosa que nunca cheguei a compreender por completo, terá oportunidade de reflectir um pouco sobre si mesmo, as suas acções, a sua personalidade e o que, em si e na África profunda, lhe parece imutável.

O David Lurie de Coetzee não é heróico, nem um idealista, nem se propõe a mudar coisa alguma. É apenas um homem já não muito novo, já não muito forte, perante uma sociedade estratificada e dura que não perdoa um deslize, mas que, ainda assim, é prolífera em favoritismos, em tirania subtil e em crueldade humana.

Terminei o romance com um travo a angústia e a frustração. África é sempre mágica, e também é sempre implacável. Este romance mostra-o com grande competência.

Classificação: 4/5****

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