sexta-feira, 13 de abril de 2012

#23 SOARES, Carla M. - Alma Rebelde

Sinopse: No calor das febres que incendeiam a Lisboa do século XIX, Joana, uma burguesa jovem e demasiado inteligente para o seu próprio bem, vê o destino traçado num trato comercial entre o pai e o patriarca de uma família nobre e sem meios. Contrariada, Joana percorre os quilómetros até à nova casa, preparando-se para um futuro de obediências e nenhuma esperança. Mas Santiago, o noivo, é em tudo diferente do que esperava. Pouco convencional, vivido e, acima de tudo, livre, depressa desarma Joana, com promessas de igualdade, respeito e até amor. Numa atmosfera de sedução incontida e de aventuras desenham-se os alicerces de um amor imprevisto... Mas será Joana capaz de confiar neste companheiro inesperado e entregar-se à liberdade com que sempre sonhou? Ou esconderá o encanto de Santiago um perigo ainda maior?


Opinião: O meu plano inicial, ao ultrapassar o meio do livro, era atribuir-lhe um quatro e meio. Ainda assim, quatro. Estava muito concentrada nas interjeições, e embirro com elas porque dão um tom afectado ao discurso, uma espécie de suspiro muito português. As interjeições (tantos ohs, e ahs! e pontos de exclamação!) mantiveram-me longe da literatura portuguesa, mas sobretudo a má qualidade dos enredos e a pobreza de escrita foram os culpados por esse afastamento. Agora, após perseguir ferozmente este livro durante a tarde de hoje (12.04.2012), em que saiu para a luz do mercado, agora... que acabei de o ler, convido todos nós, portugueses e portuguesas amantes de um bom romance histórico, de um um bom nível de português - acessível e bem alinhavado - a embrenharem-se neste livro, que é quase uma viagem contínua. Li-o de enfiada, como se comprova com facilidade. Fala sobre uma rapariga, Joana, cujo pai é rico e despoleta, assim, as ambições de um nobre na miséria, D. Miguel. Este D. Miguel arranja um casamento entre Joana e o seu filho, Santiago, para que com o dote possa reaver um pouco da sua glória passada. 

O que dizer destas personagens? Gosto mais do Santiago que da Joana, é a verdade. Mas parece-me que ela foi escrita para se entranhar, e ele para nos apaixonar-mos à primeira vista. Contudo, no enredo, é o oposto que sucede entre os dois. Ela estranha-o e ele fica vidrado nela. 

Não é o enredo em si que me faz valorizar a história - achei a Joana um pouco queixosa para uma pessoa que tinha a melhor amiga numa situação muito pior - mas sim a humanidade que encontrei nas personagens e, sobretudo, o talento evidente da escritora, que soube valer-se de conta e medida para se manter num terreno seguro. Não dramatizou excessivamente, não caiu em clichés, surpreendeu-me até várias vezes, e agradavelmente, o que raramente acontece quando leio, posto que já li tanta coisa. 

O Santiago é cativante, qualquer mulher o quereria para si. A D. Ana é enternecedora e o D. Miguel é daquelas pessoas frustrantes com quem temos perfeita consciência de que nunca conseguiremos lidar. Considerei todo o desenrolar de acontecimentos bastante pertinente e, apesar de algumas falhas de comunicação entre as personagens principais, a autora teve suficiente mestria para nos fazer compreender, com clareza, o porquê de se compreenderem as asserções de modo oposto. O romance prometia sensualidade e gabo também a elegância, a classe, com que conseguiu envolver-nos nessa sugestão sem cair nas vulgaridades que tenho lido em muitos livros ultimamente. Já me tinha esquecido que, tal como no E Tudo o Vento Levou, meia palavra arrepia muito mais do que uma frase completa à letra. 

Curiosamente, a Joana é a personagem de quem gostei menos. Achei que a Rosália (a ama dela), a dado momento, perdeu-se no enredo, mas adorei a construção geral. Dei por mim a sorrir em diversas partes, dos atrevimentos do Santiago e das explosões da Brites e da doçura da D. Ana. Os desvios de língua da Joana também deram pano para mangas, porque incitaram o Santiago a revelar-se mais. 

Os termos históricos acho que vieram na medida certa. Dei por mim extasiada ante a menção do meu adorado romance Madame Bovary, do Flaubert, e de outras referências históricas que reconheci de imediato porque sou amante da História. O casamento de D. Pedro com D. Estefânia. A América com presidentes e quase, quase em cima da Guerra de Secessão. A inauguração, em 1856, do primeiro troço de caminhos-de-ferro em Portugal. O Brasil e a promessa de uma vida melhor... Nas últimas páginas retive o fôlego, a autora virou o enredo de forma tão convincente que vislumbrei um final alternativo para o livro, vestiu-o de nexo e de credibilidade e deixou-me a arfar por ler mais depressa. 

Em suma, todo o livro foi lido de um só sopro. Os meus sinceros parabéns àquela que considero, sem dúvida, a melhor autora de romances «romance» portuguesa. Destronou a rainha da pop destas bandas (ou rainha da asneira e da futilidade), Margarida Rebelo Pinto (atenção que nunca foi rainha alguma para mim). Um adeus também ao Tiago Rebelo, reforme-se porque não atinge (com o seu jornalismo e quês), metade da perícia com as palavras, metade da profundidade e da complexidade humanas que a Carla expôs. Um triunfo perfeito para um primeiro lançamento. Fico a contar os dias até ao próximo.
Classificação 5*****

7 comentários:

  1. Muito obrigada! Foi a minha estreia, o meu primeiro livro publicado e também a minha primeira opinião. Ainda bem que lhe deu prazer a leitura e... bom, menos interjeições da próxima vez! :)

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Eu também adorei o livro, quando o li ainda em manuscrito e principalmente porque li obras de outro estilo da autora e fui surpreendida por este romance que me empolgou. Mas eu conheci-o como Joaninha...e gosto da personagem. Agora, vou relê-lo em breve para redescobrir outros personagens...Quanto a esperar por mais obras, acredite que vale mesmo a pena, e são sempre surpreendentes!!!

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  4. A mim não tem que me convencer, Cristina. Estou mais do que convencida!

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  5. Fiquei empolgada com a opinião. Vou ter que ler o livro.

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  6. Eu já li e concordo com a opinião...ADOREI!!!

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