sábado, 9 de agosto de 2014

#116 SMITH, Deborah, O Café do Amor



Sinopse: Cathryn Deen vivia num mundo de sonho: atriz famosa, idolatrada, era considerada a mulher mais bela do planeta. A fama era tudo na sua vida. Mas após sofrer um trágico acidente de automóvel, que a deixa marcada para sempre, decide ocultar-se de tudo e todos.
Escondida na casa da sua avó materna nas montanhas da Carolina do Norte, Cathryn tenta ultrapassar os seus traumas com a ajuda da sua grande prima Delta, uma mulher roliça e bem-disposta, dona do café local. Considerada por todos a alma daquele vale, Delta alimenta com os seus cozinhados e biscoitos deliciosos o corpo e o espírito dos mais carentes.
Um dos seus protegidos é Thomas Mitternich, um famoso arquiteto, fugido de Nova Iorque, após os atentados às Torres Gémeas lhe terem roubado o que de mais valioso tinha na vida: a mulher e o filho. Atormentado pela culpa, Thomas acredita que nada nem ninguém lhe poderá devolver a razão de viver e, entregue ao álcool e ao desespero, espera um dia ganhar coragem para se juntar àqueles que mais amava. O destino irá cruzar os caminhos de Cathryn e Thomas numa história magnífica de superação, ensinando-os a transformar as adversidades em oportunidades e a valorizar a beleza que existe em tudo o que os rodeia.
Opinião: Tendo lido “A Doçura da Chuva” e recordando-me do quanto essa obra me enterneceu, lancei-me n’O Café do Amor com grandes expectativas. Apesar disso, o livro excedeu-as (detesto a expressão “encheu-me as medidas”).
Há uma doçura e uma crueza intrínsecas nas histórias de Deborah Smith. Nada de milagres. Aqui fala-se de superação. No caso deste livro, como a própria sinopse anuncia, lidamos com duas pessoas marcadas por tragédias pessoais.
Cathryn Deen é uma espécie de Julia Roberts inventada pela autora. Uma mulher bela (“a mais bela do mundo” segundo uma série de revistas enumeradas), casada com um oportunista e autora de uma linha de cosméticos chamada “Flawless”, que significa, mais ou menos “Perfeita” – ou, literalmente, “sem defeitos”. Por ironia do destino sofre um acidente de carro, parte do corpo é consumido pelas chamas e assim perece também a beleza que lhe abriu tantas portas, a auto confiança e aquilo que definia a sua identidade. Perdida, acaba por aceitar refugiar-se nas Apalaches do Sul, na Carolina do Norte, desesperada por encontrar um novo sentido para a sua vida e por esconder o seu rosto desfigurado dos media.
Thomas Mitternich é um homem perturbado. A catástrofe do 11 de Setembro levou-lhe a mulher e o filho e ele refugiou-se no mesmo local onde Cathryn vem esconder-se. A dona do café de Crossroads, Delta, vai tentando afastá-lo da depressão e das tendências suicidas com biscoitos e tarefas que lhe vai impondo. Apaixonei-me pelo Thomas ao primeiro telefonema que ele fez à Cathy. Não se conheciam e ele foi instigado pela Delta, prima afastada de Cathryn, a consola-la enquanto ela se encontra na Unidade de Queimados, isolada do mundo, confusa e assustada.
Como mencionei, é um livro sobre superação. Sobre ultrapassar-se cicatrizes tão grandes que ameaçam o rumo das nossas vidas. Sobre fechar-se a porta sobre os receios e os pesadelos. Sobre reaprender-se a viver, passo a passo, reaprender-se a dar-se valor e a ser-se útil para alguém. Reviver, depois de se ter perdido tudo e de termos deixado de ser quem éramos – pai, marido, actriz famosa, admirada, bajulada. Reaprender a ser.
Apesar de ter lido comentários onde se diz que o livro é um tanto previsível, não considero a imprevisibilidade um factor determinante para a qualidade de um livro. É bom que existam livros que nos levam a desconfiar que vai acabar tudo bem. Que um dia o Thomas vai deixar a bebida e a Cathy vai deixar de esconder o rosto com lenços. É bom acreditar que vão superar, que é possível salvar o nosso espírito após um rombo tão grande no barco. Que a alma é costurável, recuperável, reciclável. Que só é precisa a pessoa certa com a cola certa. Que uma chávena rachada pode ser restaurada, embora a fenda seja sempre visível num estudo mais cauteloso.
Por muito bonito – e muito actual, e muito socialmente aceitável e até desejável – que as pessoas se desembaracem sozinhas, a verdade é que uns sem os outros somos nada. E este livro ilustra a ausência de vergonha em precisar-se de ajuda e em depender-se doutrem para se sair de um buraco pessoal e se voltar a amar e a ser feliz.

Classificação: 5*****