Opinião: Nos últimos dias, embrenhei-me em duas histórias que
me absorveram a alma, Longe da Multidão (o filme de 2015 inspirado no livro de
Thomas Hardy), e North and South (a série da BBC de 2004, que de longe foi a
história que mais mexeu comigo pela complexidade do retrato social e do
carácter das personagens principais). Tomei também conhecimento de um filme a
sair com a Saoirse Ronan, “Brooklyn”, que me pareceu igualmente interessante.
Julguei que o livro abordasse os anos cinquenta numa perspectiva de retrato
social. A emigração em larga escala de alguns países europeus para a América,
as dificuldades e as realizações que daí adviessem. E, no campo do amor, a
difícil escolha entre um italiano amoroso na sua vida nova, ou um irlandês
tradicional no país que abandonou.
Aconteceram duas coisas
inesperadas com este livro… A primeira é que o li de um sopro, também tem
apenas cerca de 250 páginas, e ando numa fase pouco produtiva de leitura. A
segunda é que detestei a personagem principal e a condução geral que o autor
fez do livro. Nunca se sabe o que a Eilis pensa ou quer, a criatura é
completamente frívola e passiva ao ponto da exasperação. Perdi a conta às vezes
que recorreu à procrastinação para evitar confrontos ou que surgiu a frase
“pensou em dizer x, mas o melhor era ficar calada”. Tudo se decide ao seu redor
sem que ela tenha qualquer parecer nisso: dança com quem a convida, beija quem
tenta beijá-la, aceita convites que depois declara não querer ter aceitado,
muda de país sem o querer, regressa a casa para lidar com uma mãe que já não
compreende, debate-se com o dilema de ficar em casa com a mãe que a chamou ou
regressar a Brooklyn, onde começara uma nova vida. Nenhuma decisão é baseada no
que quer, a moça não tem pulso na sua vida e isso é-me desagradável de ler.
Atenção, é verdade que sou apaixonada por anti-heroínas e nem todas as
personagens principais podem ter o calculismo de uma Scarlett O’Hara, a
determinação cega de uma Cathy Earnshaw ou o brilhantismo de uma Lisbeth
Salander, mas não há um pormenor na Eilis que seja digno de elogio.
Penso que o autor conduziu mal a história. Não
há um objectivo, só me ocorre a expressão “pointless”. A pesquisa histórica
está feita, os detalhes são interessantes q.b., o retrato de Brooklyn e da
Irlanda são pictóricos, não se mergulha nas entranhas de um país e doutro, nos
prós e contras de se decidir onde se quer envelhecer, ao lado de quem, fazendo
o quê. Faltou profundidade à Eilis, assim como a quase todas as outras
personagens. Nenhuma se destaca por traços bem marcados excepto, talvez, o
apaixonado e leal Tony.
O livro é superficial, light, e por isso mesmo
devorei-o com tanta rapidez. Queria muito ter gostado desta obra, mesmo porque
amo a Irlanda e a história do povo irlandês, e aqui estava mesclada com um
passado em comum ao povo italiano, e teria sido tão proveitoso explorar-lhes as
nuances… E se a Eilis tivesse dois dedos de testa e tomasse decisões, tudo
poderia ter sido tão melhor desenvolvido…
A escrita de Colm Tóibín é simplista, não há um
trecho que valha a pena sublinhar ou uma passagem de marcada profundidade. A
natureza humana é aqui, deste modo, desperdiçada.
Pena, porque quis muito gostar dele…
Deixo também uma nota quanto ao facto de me
parecer que a tradução para português peca muito. Li várias passagens que não
me soaram bem, perdi a conta às vezes que li “devia de ser”, e fico sempre na
dúvida se é realmente assim que se diz… E “doce”, e “encantadora”, e
“maravilhado/fascinado”, etc… Pode ser problema da versão original, ou simples
falta de criatividade conjunta. É disso que acuso o livro: falta de cor, falta
de criatividade para preencher uma tela tão promissora.
Não é dos que
aconselho.
Classificação: 2**/****
Sinopse: Numa pequena vila irlandesa dos anos cinquenta, Eilis é uma das muitas
pessoas da sua geração que não consegue arranjar trabalho. Quando surge uma
oportunidade na América, é-lhe evidente que tem de partir. Jovem, sozinha e
saudosa, Eilis começa uma nova vida em Brooklyn e a sua tristeza vai sendo
gradualmente apaziguada. Quando notícias trágicas a obrigam a regressar à
Irlanda, vê-se confrontada com uma escolha terrível: entre o amor e a
felicidade na terra a que pertence e as promessas que tem de manter do outro
lado do oceano. Uma história de partida e regresso, de amor e perda, da escolha
entre a liberdade pessoal e o dever.
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