Sinopse: Molching, um pequeno
subúrbio de Munique, durante a Segunda Guerra Mundial. Na Rua Himmel as
pessoas vivem sob o peso da suástica e dos bombardeamentos cada vez mais
frequentes, mas não deixaram de sonhar. A Morte é a narradora
omnipresente e omnisciente e através do seu olhar intemporal, é-nos
contada a história da pequena Liesel e dos seus pais adoptivos, Hans, o
pintor acordeonista, e Rosa, a mulher com cara de cartão amarrotado, do
pequeno Rudy, assim como de outros moradores da Rua Himmel, e também a
história da existência ainda mais precária de Max, o pugilista judeu,
que um dia veio esconder-se na cave da família Hubermann. Um livro sobre
uma época em que as palavras eram desmedidamente importantes no seu
poder de destruir ou de salvar. Um livro luminoso e leve como um poema,
que se lê com deslumbramento e emoção.
Opinião: A Rapariga que Roubava Livros é uma
história inesquecível. Cada personagem é mais memorável do que a outra, mas o
ponto mais precioso de todos, onde o autor prima, é nas relações interpessoais.
A Morte é a narradora, o que causa
arrepios ocasionais ao leitor, mas também nos transmite uma sensação de
pequenez que vem a calhar em certas épocas da história. Quando nos consideramos
maiores e super-poderosos, vem a morte dizer que nos observa de cima. Que nos
acolhe no último momento, sem se impressionar com os homens e com as suas
vilezas.
A Morte, que em 1943 diz ter estado
em toda a parte, graças ao Fürer,
narra-nos aqui a história de Liesel Meminger e das vezes em que as duas se
cruzaram. A pequena órfã da rua Himmel (Céu), nos subúrbios de Munique, fora
acolhida pelo acordeonista Hans Hubberman e a sua mulher com a estrutura de um
roupeiro, Rosa Hubberman.
Tantas vezes lemos sobre a II Guerra
Mundial, sempre da perspectiva dos aliados, das vítimas arrastadas para um
conflito acicatado pela ambição doentia de Hitler, ou da perspectiva dos judeus
estilhaçados pela sua loucura. Aqui temos um romance que nos mostra os alemães
perante o Fürer, pálidos, trémulos,
receosos, de boca amordaçada e membros agrilhoados. Nada de se rebelarem, nada
de terem pena, nada de se permitirem ser humanos, nada de desobedecer. Liesel
não entende bem o que se passa, só sabe que há fogueiras de livros proibidos,
fome, pessoas a serem arrebatadas aos seus lares e aprisionadas na farda da
Alemanha nazi. Fanáticos – também os há -, que só atendem os clientes se estes
erguerem a mão e bramirem Heil Hitler.
Esta é uma história de corações
humanos que são obrigados a silenciarem-se pela loucura geral.
É uma visão única da guerra, pela perspectiva alemã, que nos mostra relances de
caridade e gentileza. Cada interveniente na vida de Liesel é enternecedor,
pessoas vibrantes e cheias de personalidade; o papá, de cigarro ao canto dos
lábios e olhos cor de prata, a mamã a chamar nomes a toda a gente – especialmente aos que ama – o seu amigo
Rudy, de cabelos cor de limão, a pedir-lhe um beijo. Max e os seus desenhos, a
sua saudade e a sua angústia face à família judaica que lhe foi arrebatada. As
noites no abrigo antiaéreo e uma menção ao dia de Julho em que a Operação
Gomorrah arrasou 45 mil vidas em Hamburgo, onde eu própria estive. Tanta dor, tanta perda... e tão real. Eu diria até, tão recente. E a Morte, como testemunha-mor, a
expor os eventos de forma inesquecível, arrebatadora, única. Um livro sem igual, que quebrou o
meu jejum literário de 2014. Vejam também o filme, o casting é perfeito.
Classificação: 5*****
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