quarta-feira, 16 de julho de 2014

#114 SHREVE, Anita, A Vida Secreta de Stella Bain

Sinopse: Neste envolvente drama, Anita Shreve tece uma apaixonante história acerca do amor e da memória, tendo como pano de fundo uma guerra que devastou milhões de civis e deixou sequelas em todos aqueles que testemunharam os seus horrores. Um romance histórico inesquecível, sério e surpreendente. França, 1916. Uma mulher acorda na cama de um hospital de campanha em Marne, sem qualquer recordação do seu passado ou de como ali chegara. Identificou-se como Stella, mas sente que esse não é o seu verdadeiro nome. De repente, uma palavra incita-a a agir e Stella parte para Londres, onde espera encontrar algumas respostas e abrir as portas para o seu passado. «A viagem interior de Stella permite-nos vislumbrar os horrores da Grande Guerra, o dealbar da psicoterapia e a primeira vaga do movimento feminista... A história de uma mulher improvável e misteriosa.» Los Angeles Times «Contido e elegante, este romance de Anita Shreve revela um conhecimento profundo das dificuldades que as mulheres sentem quando tentam viver a vida segundo os seus próprios desejos.» People «Fascinante... Um romance afetuoso com um tema sério e complexo.» Washington Post «Um livro terno e desapiedado.» Publishers Weekly «Comovente, enternecedor, por vezes tão intenso e vivo que quase conseguimos sentir o medo.» Boston Globe «Um livro que vale mesmo a pena ler!» 

Opinião: Não há um livro da Anita Shreve que não me cative. Tudo porque a escritora tem um jeito despretensioso de apresentar as situações, e é exímia em descrever as cicatrizes que ficam na alma após um trauma.
No início do livro estava intrigada quanto a Stella Bain, a desmemoriada. Mas a autora, que é do género que permite ao leitor formar a sua própria ideia das personagens, não a descreveu fisicamente, nem sequer a pôs a ponderar sobre a sua idade. Na verdade, a primeira parte do livro é um pouco superficial e apressada, sobretudo tendo em conta que a segunda parte, a partir da “revelação”, é tão mais detalhada. Talvez esse vazio seja um relance do interior da mente de Stella, desprovida de quaisquer recordações.
A autora, contudo, não quis focar-se demasiado na situação da enfermeira de guerra sem memória, que acaba por ser o chamariz para o livro se nos basearmos apenas na sinopse. Neste âmbito é abordada a terapêutica de Freud, em voga tanto em Inglaterra como na América, e a doente é temporariamente tratada por psicoterapia. O Doutor August Bridge surge nesse contexto, como estudioso de Freud e interessado nos mistérios da Psiquiatria. O mundo ultrapassava horrores jamais vistos e, regressados das trincheiras e da frente, as capitais europeias estavam assoladas de soldados amputados, desfigurados, desmembrados.
Acabei por entender esta opção de criar uma primeira parte para o livro mais leve, posto que esse estado é apenas um reflexo do papel de Stella no cenário de guerra que a Europa atravessa, e um eco da sua própria mente confusa e amnésica. É um aparte entre o livro anterior, “Tudo o que Ele Sempre Quis”, que devo ter lido há mais de cinco anos, e o desenrolar da história de Etna Bliss. Só entendi a ligação entre os dois livros quando Stella recupera a memória.
A segunda parte do livro, que parece ter aborrecido outros leitores, é a que mais me prendeu. A ligação à sua vida passada, que eu conhecia doutro livro, os seus antigos amores, erros por corrigir e culpas formadas… Há, contudo, fortes ligações a outros livros da autora. É normal, já li várias obras suas e começo a detectar aquilo que a move e intriga. O mundo académico e a Medicina estão sempre muito presentes, bem como a forte amizade entre mulheres e homens, mesmo em épocas em que isso não era bem visto. Por fim, as sequências sobre um julgamento em tribunal pela guarda de um menor recordou-me muito o “A Praia do Destino”, que é o meu livro favorito dela.
Acho a Anita Shreve uma criativa de grande humanidade, sensível e detentora de uma classe que eu jamais terei. Em parte porque a admiro nela, é-lhe natural e intrínseca. Em parte porque a sua crueza elegante foge um bocadinho ao caos que eu gosto de explorar.
Ainda assim, cada nova obra sua é, para mim, um grande momento de leitura.

Classificação: 4****/*

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