segunda-feira, 26 de setembro de 2016

#171 HANNAH, Kristin, O Rouxinol


Sinopse: Na tranquila vila de Carriveau, Vianne despede-se do marido, Antoine, que parte para a frente da batalha. Ela não acredita que os nazis vão invadir a França… mas é isso mesmo que fazem, em batalhões de soldados em marcha, em caravanas de camiões e tanques, em aviões que enchem os  céus e largam as suas bombas por cima dos inocentes. Quando um capitão alemão reclama a casa de Vianne, ela e a filha passam a ter de viver com o inimigo, sob risco de virem a perder tudo o que têm. Sem comida, dinheiro ou esperança, e à medida que a escalada de perigo as cerca cada vez mais, é obrigada a tomar decisões impossíveis, uma atrás da outra, de forma a manter a família viva. Isabelle, a irmã de Vianne, é uma rebelde de dezoito anos, que procura um objetivo de vida com toda a paixão e ousadia da juventude. 
Enquanto milhares de parisienses marcham para os horrores desconhecidos da guerra, ela conhece Gäetan, um partisan convicto de que a França é capaz de derrotar os nazis a partir do interior. Isabelle apaixona-se como só acontece aos jovens… perdidamente. Mas quando ele a trai, ela junta-se à Resistência e nunca olha para trás, arriscando vezes sem conta a própria vida para salvar a dos outros. Com coragem, graça e uma grande humanidade, a autora bestseller Kristin Hannah capta na perfeição o panorama épico da Segunda Guerra Mundial e faz incidir o seu foco numa parte íntima da história que raramente é vista: a guerra das mulheres.  O Rouxinol narra a história de duas irmãs separadas pelos anos e pela experiência, pelos ideais, pela paixão e pelas circunstâncias, cada uma seguindo o seu próprio caminho arriscado em busca da sobrevivência, do amor e da liberdade numa França ocupada pelos alemães e arrasada pela guerra. Um romance muito belo e comovente que celebra a resistência do espírito humano e em particular no feminino. Um romance de uma vida, para todos.

Opinião: A minha primeira impressão quanto a “O Rouxinol” não foi muito abonatória. Não posso abstrair-me da ideia de que a autora ainda estava à procura da sua voz – e isso é bem mais difícil do que parece. Nesse processo, surgem frases tipo slogan como "O que era o amor quando confrontado com a guerra?". Achei que o primeiro terço do livro é fraco, superficial, demasiado leviano na sua apresentação das personagens. Eu sabia que haveria aqui um contraste locus amoenus (paisagem idealizada, luminosa, verdejante) e locus horrendus (cenário horrendo, desprovido de luz). O melhor exemplo de uma saga que explora as duas é O Senhor dos Anéis , em que o Shire é tudo de perfeito e Mordor é um inferno na Terra. Porém, considerei que até para entre-guerras, o cenário inicial era perfeito demais. Segundo me recordo, tanto a França como a Alemanha sofreram imenso durante a I Guerra, e depois dela estavam pejados de estropiados, mutilados, doentes crónicos por causa dos gases, da gripe Espanhola, da tuberculose, etc., além das dívidas. Não é à toa que os principais combates foram no Somme, os terrenos continuaram cheios de minas e granadas por explodir nos anos subsequentes. Quinze anos é muito pouco tempo para que alguém se exibisse tão feliz e tão optimista, e sobretudo tão descrente de que outra guerra viesse aí. Isto é a Vianne. Na página três já ela e o marido haviam dito umas cinco vezes “Eu amo-te”. Tudo bem, deve haver casais e casais. Mas ao final de dez anos de casados ainda sentirem essa necessidade a cada vez que tiram uma garrafa de vinho do cesto de piquenique? Os olhares cruzam-se e “Eu amo-te”. Gostava de ter sentido um maior realismo nessa parte, mas posso ser só eu a embirrar, porque as minhas expectativas eram altíssimas. Durante esse primeiro terço não consegui desligar-me do papel de escritora/revisora, e o potencial era tão grande que me via a rasurar imensa coisa. Sobretudo as listagens de produtos franceses (tinha cerâmica de Limoges, e do cesto tirava vinho daqui, Camembert, Roquefort, champagne de acolá, a baguete, só se esqueceu do croissant). Achei as personagens desprovidas de profundidade. A impulsividade da Isabelle era por vezes embaraçosa, depois ao longo da segunda parte e da terceira a autora cimentou melhor o seu carácter estouvado. Pô-lo a servir um bem maior e fez o leitor se preocupar com ela.

Divido o livro em três partes: 

I: A guerra aproxima-se, Paris é invadida, um general alemão vem instalar-se na casa da Vianne.
II: Os meses vão-se passando em provações, Vianne acomoda-se e Isabelle rebela-se, começam a ser perseguidos os membros da resistência, homossexuais, comunistas, judeus.
III: A Alemanha começa a perder a guerra e a sua crueldade extravasa todos os horrores que já haviam infligido até aí.
Gostei da parte do livro que acaba por unir as duas irmãs, e em que o amor de uma pela outra triunfa. Também gostei da dificuldade que ambas tinham em relacionar-se com um pai que fechava os olhos e ainda se via nas trincheiras, a combater na I Guerra. O que aprecei, acima de tudo, foi a pesquisa histórica, muito bem distribuída pelos anos do conflito. (Estando eu própria a escrever um livro sobre a mesma época, essa foi a primeira abordagem que ponderei: seguir a cronologia da Guerra, é o mais lógico). Também gostei do facto de haver uma premissa inicial, laivos de 1995, em que se entende que uma das irmãs morreu na guerra e a outra sobreviveu. Por esse motivo, prossegui a leitura com os meus sentimentos a oscilar ora para uma, ora para outra, e a tentar adivinhar qual delas teria mais chances de sobreviver e de percorrer o caminho que a levou à América, cinquenta anos depois.
Há também outra questão premente: houve uma infinidade de crianças a perder-se dos seus progenitores, a ficarem sem família de todo, a serem, por exemplo, acolhidos temporariamente em países como Portugal (recebemos Austríacos após a guerra), e houve muitas violações que terminaram em filhos que talvez, por vergonha das mães, tenham agora setenta anos e nunca venham a saber que foram criados por um pai que não era o deles, e que a biologia os liga à Alemanha e às criaturas que destruíram a dignidade da França durante essa guerra abominável.
Aconselho vivamente; este livro recordou-me de algo importante, porque ainda há poucos anos houve uma mãe finalmente reunida com o filho: a II Guerra ainda não acabou para toda a gente.

Classificação: 4****/* 

1 comentário:

  1. Olá Célia,
    Que bom que foi uma boa leitura. Já li boas opiniões sobre este livro. Quero muito ler.
    Beijinhos e boas leituras

    ResponderEliminar