segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

A Filha do Barão


Há muito que queria escrever um romance histórico. A História é a minha grande paixão e a escrita é o meu modo de crescer e de me expressar. Há cerca de cinco anos que investigo o Terramoto de 1755 e, antes de começar a escrever o “1809”, agora apenas “A Filha do Barão”, fiz várias tentativas goradas de começar a escrevê-lo. O terramoto de 1755 é um poço sem fundo de informação. A cada passo que dava, descobria outro estudioso, outro contemporâneo, outro documentário português, europeu, brasileiro, etc., a seu respeito. No entanto, não me sentia com forças de começar esse romance.
Quando comecei a escrever “A Filha do Barão”, tudo o que sabia era que tinha alguns elementos díspares que iria tentar combinar; um inglês empreendedor, o vinho do porto nas mãos dos britânicos, uma jovem teimosa, um casamento arranjado. E era tudo. Sabendo que estava bloqueada quanto ao “1755”, decidi que este livro seria uma experiência. Seria eu capaz de criar algo que me satisfizesse no campo da ficção histórica? Perguntava-me quantas vezes tropeçaria na mesma cena. Enquanto estivessem sentados, de onde era a cerâmica?     Que motivos exibia? Como se dirigiam uns aos outros? De quantos serventes dispunham? Quais as tarefas diárias de um lar? As obrigações religiosas? O traje? As jóias? O esperado de cada estrato social? Adivinhava-se demasiado difícil. Se calhar é por isso que tanta gente opta por pegar numa rainha de vestes opulentas e investigar-lhe a vida ao pormenor. É bem mais fácil dissertar sobre alguém famoso, sobre o qual há tantos rumores e referências, do que criar alguém de raiz e implantá-lo no início do séc. XIX. Contudo, após ler vários capítulos da Gazeta de Lisboa, comecei a mergulhar na mentalidade da época. Uma notícia em especial deu-me alento para continuar: um tal de senhor Manuel morria, aos 104 anos, e conservara todos os dentes. Trabalhara até ao fim. E, com isso, estava o pontapé de saída dado. Acostumei-me aos ofícios, aos dinheiros, à forma de tratamento. Dei alma às personagens e vali-me de inúmeras notas, bem como dos diários da Clarissa Trant, para avançar na trama. Um dos pontos cruciais seria estabelecer um prisma através do qual os britâncios vislumbrassem os portugueses. Foquei-me nas diferenças, nos passados, nas alianças, nas centenas de romances de época que li passados na Inglaterra. Debrucei-me ainda na moda, no progresso, nas ligações políticas entre os dois países, na cozinha, na bebida, nos serões de cavalheiros de um e doutro país. E apaixonei-me; pela época, pelos ideais e por estas pessoas.
De todos os livros que escrevi até agora, é ao reler “A Filha do Barão” que menos me reconheço. Porque este livro foi, mais do que qualquer outro, uma criação minha para mim. Para que eu possa ler aquilo que gostaria que existisse no mercado da literatura portuguesa. Há alguns romancistas históricos no panorama nacional que me afastaram dessas leituras, alguns deles têm vários livros em séries de rainhas, personagens icónicas da nossa História, mas achei-os tão insípidos… As rainhas como mártires, como receptáculos de desgraças e profecias de catástrofes, a estrutura muito habitual, as melancolias da infância e as projecções goradas de futuros. Não me surpreenderam nem me prenderam de modo algum. Noutros casos, a pesquisa histórica estava tão atabalhoadamente incrustrada no livro que se separa, sem dificuldade, a ficção da informação que o autor insiste em despejar naquelas páginas. Confesso que nunca li a Maria Teresa Horta nem a Maria João Lopo de Carvalho, mas os traumas anteriores fazem com que a vontade seja pouca.
Precisava de ir à livraria e encontrar algo que combinasse História - do meu país, de preferência -, erotismo com nível, personagens com conteúdo e um enredo que me prendesse. Não encontrando, sentei-me a escrever sobre este amor construído. Sobre estas pessoas imperfeitas que se esforçam por se aperfeiçoar, por crescer e por fazer face aos obstáculos de uma época conturbada.
No livro abordo não apenas as invasões napoleónicas, mas também a queda da Ponte das Barcas e a partida da família real para o Brasil. São três acontecimentos de grande importância para a nação portuguesa, entrelaçados com a história de Inglaterra, da França, da Espanha e do próprio Brasil. Não foi um momento fácil para me estrear nestas andanças, mas se não encontrasse algo que me cativasse teria sido incapaz de levar este romance a bom porto.
Escrito na íntegra entre Abril de Novembro de 2012, sofreu várias revisões e ajustes. Agradeço à Ana Ferreira e à Inês Montenegro pelos conselhos a seu respeito. Houve muito a desbastar.

Em breve convosco, prometo 575 páginas daquilo que, até hoje, escrevi de melhor. 

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