Sinopse: Quando o relógio pisca as doze horas intermitentes, Carla recebe no seu quarto uma visita indesejada.A partir daí, todo o seu mundo desmorona e a solidão e o medo encarregam-se de a arrastar para um estado deprimente que só um desconhecido parece compreender.Cega de paixão, nega as evidências de que o seu novo amor é mais do que um rosto angelical. Ele esconde segredos que a levarão para perigos que parecem emergir das profundezas do inferno.
Opinião: Tenho imensa coisa para
dizer a respeito desta primeira obra da Andreia Ferreira. Antes de mais,
permitam-me clarificar um ponto: eu e a autora partilhamos a mesma editora, mas
não temos contrato algum de bajulação mútua. Que isso fique claro, até porque
ela é uma mulher do norte sem papas-na-língua e eu também tenho costela do
Norte. Enfrentámo-nos ao vivo e a cores na Feira do Livro de Lisboa, no passado
dia 6 de Maio, e o compromisso foi de que lhe daria a minha opinião sincera.
Ela estava com receio de que não fosse favorável – porque o sobrenatural não é
o meu género, nem nunca li nada se não agora A Guerra dos Tronos – e eu estava
aterrorizada com a possibilidade de não gostar do livro e não saber como
dizer-lho. “Er…, dou-lhe um três e depois digo que está muito bem escrito mas
não gosto destas coisas”, era esse o meu plano b), se não tivesse gostado da
obra. O que, como vêm pelas cinco estrelinhas a cintilar a vermelho, não foi o
caso.
Esta classificação
espelha a minha redenção face ao cepticismo e também a minha estupefacção
quando fechei o livro, há minutos. É uma lição de humildade e de mente aberta.
Quando, por volta de Junho do ano passado, tomei conhecimento da existência
deste livro no catálogo de obras da Alfarroba pensei: que péssimo, a febre dos
vampiros chegou a Portugal. E que sabia eu dos vampiros ou deste género
literário? Exactamente, nada. Fiz logo o quadro todo em mente: a autora devia
ser uma adolescente que vivia na lua (e, se vive na lua agora sei que é no bom
sentido!) e que era maluca pelo Crepúsculo e tinha copiado a história, mais
coisa menos coisa. Os preconceitos - pré-conceito - surgem em relação aos assuntos mais inesperados, e assim me apercebi de como estava a julgar erradamente alguém pelo seu gosto de leitura/escrita. Mas isso passou-se há um ano atrás, e entretanto a Andreia tem-me vindo a dobrar. Primeiro com a sua simpatia e prontidão, depois e definitivamente com a sua obra.
Qual foi o meu banho de
cair no real quando comecei a falar com a Andreia e descobri que é uma adulta responsável
– jovial, divertida e tagarela – que, de facto, vive na lua e sorve daí a sua
inspiração e daí lhe advém o talento. Vou roubar as palavras da própria em
relação a mim: Quando há talento, há! E encontrei-o logo desde o princípio do
livro. Às primeiras palavras tornou-se óbvio que ela não tem necessidade de se
esforçar – é-lhe inato, vêm-se trechos que só podem advir de uma espontaneidade
fluída que é o que consolida os bons escritores, os escritores de gema. A primeira
parte do livro (aí até à página cem) é, de facto, um pouco difícil de
desbastar. Isto porque a narração é fluída, com laivos de bom humor, e espelha
muito bem – melhor do que bem, através de expressões idiomáticas – a essência
do povo português. Da família portuguesa – sobretudo da mãe portuguesa, que
quase “aterroriza” esta adolescente, a Carla, como as nossas mães e avós nos
aterrorizam a nós com a hora do deitar e a pressa do levantar e os “ó filha
isto” e “ó filha aquilo”. Foi muito português de Portugal, e adorei essa faceta da história. Li, nalguns comentários, que as referências da
Andreia lhe eram demasiado familiares. Bom, para mim foi tudo um terreno novo.
Exceptuando o Harry Potter, os meus livros favoritos retratam realidades
invulgares e enriquecedoras – mas realidades. Ia convencida de que ia ler um “monte
de clichés” sobre vampiros, mas levei outra bofetada quando me dei conta de que
o livro aborda toda esta temática de um modo muito mais original. Embora se
saiba que o livro é do género sobrenatural, houve ali algumas explicações, em
certas alturas, sobre a existência e realidades paralelas, que fizeram um
sentido estrondoso. Não digo que rocem uma possibilidade real, mas são
extensões complexas demasiado amplas, raciocínios bem estruturados. Não sei se
toda aquela arrumação das criaturas e dos seus mundos/realidades, misticismos e
etc., encontra par em outras obras do género, mas se for esse o caso foram bem
aplicadas. Se não for, muitos parabéns, Andreia, por teres inventado um mundo
com contornos palpáveis.
Apesar de já conhecer a
autora, consegui desligar-me dela ao ler o livro, o que espelha o quão bom ele
é, o quão bem ele flui nas minhas mãos. Quando conheço o autor e leio a sua
obra é como se bebesse as palavras dos seus lábios, como se o visse sentado a
criar a história. Mas a Andreia não – não estava em lado nenhum. A Carla é a
Carla e o livro é o livro, e ela é somente a criadora. Conseguiu criar algo de
que gosta tanto completamente desprendido de si. As palavras são acessíveis, há
momentos que me puseram de nervos em franja, outros que me enterneceram (o
romance está super bem explorado embora a Carla o viva com alguma imaturidade,
gostaria de tê-la visto resistir ao jeitosão com mais afinco, de início, talvez
ser um pouco mais desconfiada), e houve momentos em que me segurei para não me
pôr às gargalhadas. A Ana é, sem dúvida, a minha favorita. Gostei muito da
panóplia geral de personagens e, sobretudo, da coesão que lhes deste.
Como digo, um livro é
um exercício de arquitectura e a Andreia soltou pontas ali e uniu-as aqui e ainda
deixou margem para muito andamento no “Soberba Tentação”, que sai para Julho.
Vou ter que penar muito até ler o segundo e, mais ainda, até ler o terceiro!
Para terminar gostava
de dizer algo que acho que também já li algures em relação a esta autora e à
sua obra, e que não pensei vir a concordar mas que de facto concordo com
sinceridade: se fosse no estrangeiro teria inúmeras portas abertas e seria um
sucesso enorme instantâneo. Criar-se-iam clubes de fãs com números enormes e,
quem sabe, far-se-iam filmes e franchisings. Além de um bom enredo tens boas
palavras, bem escolhidas, e às vezes isso é o mais difícil. Dar substância a
uma história sem se ser pretensioso, nem aborrecido, nem maçador.
Cá fico, entristecida,
com dois meses pela frente à espera da continuação…!
Classificação: 5*****
Obrigada Célia =)
ResponderEliminarFico mesmoooo feliz que tenhas gostado**